24 de jun. de 2010

Velvet- O Sequestro




















A inauguração da loja está sendo um sucesso, pessoas influentes, empresários, políticos e a imprensa. Ontem quando recusei o convite de Claudia imaginei uma festa chata e sem graça, mas agora estou gostando.
Estamos as duas conversando quando ele se aproxima.

Meu instinto animal logo me alerta do perigo. Tento fugir, mas ele nos envolve numa conversa descontraída e mantém nossas taças de vinho sempre cheias.

Por um momento notei um olhar de cumplicidade entre ele e Claudia, mas o vinho já estava me deixando relaxada e com o rosto quente pensei: É bobagem.

Igor é meu chefe, diretor geral da empresa de tecnologia para a qual trabalho desde que deixei o “Blue Room”.

Mudei minha vida radicalmente tentando fugir do mundo do sexo e das drogas.

A maior parte dos funcionários é formada por jovens recém formados. Eles passam o dia na grande “ilha” desenvolvendo softwares. Eu fico no andar superior junto com as outras secretárias.

Agora me visto como uma executiva. Sempre de saia ou vestido, salto alto e cabelos arrumados. Roupas discretas e femininas. Maquiagem leve.

Procuro não chamar a atenção dos homens, mas parece que o efeito é o contrário do que eu esperava.

Olhares de lobos famintos arranham minha pele, olhares que desnudam meu corpo até a alma. Sorrisos e cantadas sutis.

Toda mulher deve gostar de ser notada. Eu não.
Queria que olhassem para além das minhas coxas e dos meus seios.

Igor é um deles. Tem um olhar cínico. É baixinho, usa barba, gordinho. Sempre de terno, corrente grossa dourada e o inseparável anel de ouro com uma enorme pedra de rubi. Descobri mais tarde que o anel é um símbolo usado pelos membros da maçonaria.

Entendi tudo. Ele não tem o menor perfil para ser diretor de uma grande empresa, é despreparado e prepotente. Essa mistura me enoja. Ele é asqueroso. Pior do que os homens todos que eu recebia no “Blue Room”. Eles pagavam para me ver dançar, para ver meu corpo. Eles não exerciam nenhum poder sobre mim. Na verdade o poder era meu. Sentia prazer em dominar um homem poderoso ou um homem bonito. Sentia prazer em vê-lo aos meus pés, loucos de desejo quando eu os tratava como escravos do seu próprio vício. O sexo.

Mas Igor sim. Ele tinha poder sobre minha vida, meus passos, meu dia. Nós dois sabíamos disso. Nós dois sabíamos que ele poderia tentar se beneficiar do cargo para me possuir. Mas eu fingia não saber. Fingia não perceber os olhares famintos e ás milhares de vezes que ele me chamava na sala dele para fazer algo inútil só para me ver saindo da sala e ficar me observando.

A festa está quase no fim. Os convidados se despedem e vão embora. Igor que foi inesperadamente simpático e atencioso não nos deixou sozinhas um minuto.

Na hora de voltarmos para casa ele nos oferece carona.

Eu recusei com a desculpa de que moro muito perto, mas Claudia mora longe, precisa ir até o terminal urbano para de lá ir para casa.

Aceitei. Entramos no carro. Um carro lindo, mas com aquele cheiro de chiclete insuportável que alguns homens colocam para perfumar o carro. Achei graça. Sorri. O que mais poderia esperar de um homem desses? Que mau gosto.

Deixamos Claudia no terminal urbano e seguimos juntos.

As ruas estão desertas e molhadas por uma chuvinha fina e fria, sinto um arrepio percorrer meu corpo e muita vontade chegar logo em casa, tirar a roupa, tomar um banho quente depois ficar quietinha em baixo do edredom.
Seguimos por uma rua central, mas do lado oposto da cidade e da minha casa.

-Para onde você está indo? Eu moro na Rua Padre Júlio do outro lado da cidade?

Ele sorriu. Um sorriso nervoso e apavorante. Senti medo. Ele apenas disse:


- Estou sequestrando você. Você vai ser minha hoje.

Minutos, segundos e tudo ficou claro para mim:

Ele combinou tudo com Claudia! Ele deu algum presente, prometeu algum cargo, sabe algum segredo dela. Não sei, mas não tenho dúvidas de que ele usou Claudia para me deixar nas mãos dele. Ofereceu-me vinho e boa conversa e eu sem saber bebi, bebi.

Sinto meu corpo mole, minhas pernas pesam.
Como reagir?
Como fugir dele?
Como fui cair nessa cilada?

Vi muitos casos em que as mulheres são assassinadas quando negam sexo ou mesmo depois de serem violentadas. Não posso reagir com agressividade. Preciso me mostrar compreensiva.

-Por favor, não faça isso, hoje não. Estou cansada, daqui a pouco tenho que trabalhar. Não entendo por que você está agindo assim.

Ele não responde. Não toca meu corpo, não me olha. Apenas segue como um louco pelas ruas molhadas do centro da cidade. Aos poucos percebi para onde ele está indo.

Para um motel.

Eu só tenho certeza de uma coisa: Ele não vai fazer sexo comigo. Se ele me obrigar vai pagar caro por isso.

Ele para o carro na garagem do motel. Eu não saio do carro.

-Ainda tem tempo de você desistir dessa idéia maluca. Não é assim que um homem leva uma mulher para a cama. Você deve saber que toda mulher gosta de ser conquistada, seduzida. Você vai me violentar?

-Vamos entrar Velvet. Prometo que só vamos beber uma taça de champanhe e conversar um pouco.

-Velvet?? Você está louco? De onde você tirou esse nome. Meu nome não é Velvet, é Isabella.

-Eu sei quem você é Velvet. Agora desça do carro e entre no quarto.

Fiquei atônita. Ele sabe que trabalhei no “Blue Room”. Só usava esse nome lá. Quando mudei minha vida assumi meu nome verdadeiro e tentei deixar para trás tudo o que representava aquela aquele lugar e o nome Velvet. Agora entendo os olhares de Igor, o cinismo em seu olhar, a segurança e arrogância quando falava comigo.

Entrei no quarto. Uma cama gigante redonda com espelhos por todo lado, uma banheira enorme, uma mesa e um sofá preto. Decoração de muito mau gosto.

Ele abriu um champanhe e me ofereceu uma taça. Sentei-me no sofá pensando como sair daquela situação perigosa. Eu sei do que é capaz um homem enlouquecido de desejo e raiva, rejeitado.

Ele bebe toda a taça de champanhe de uma vez e fala:

-Eu descobri tudo sobre você quando notei que você parecia guardar algum segredo.

Você é misteriosa, diferente das outras meninas. Seus olhos fogem quando olho para você, mas seu corpo pede para ser tocado. Fiquei curioso então contratei um detetive amigo meu.

Foi difícil, mas consegui descobrir o que você fazia antes de trabalhar comigo.

-Não sei o que você quer dizer com “sabe tudo”. Eu não fazia nada demais. Eu apenas dançava para poder sobreviver. Não havia sexo como sua mente suja deve imaginar e isso não llhe dá o direito de me raptar e me obrigar a fazer sexo com você.

-Você acha que sou burro, menina? Acha que vou cair nessa?

-Você pode pensar o que você quiser. Mas a vida é minha e só eu sei o que eu fiz ou deixei de fazer. Só eu sei também o que não quero fazer.

Ele ligou a banheira que logo ficou cheia de água e espuma. Despiu-se e foi para a banheira.

Eu no sofá, pernas cruzadas. Séria e um pouco tonta. Apavorada.
O medo não era ser violentada. O medo é o que ele faria comigo depois.
Mil coisas, mil pensamentos, artigos de jornais, notícias de casos semelhantes.

-Você não sente nada por mim?

-Não. Você é casado e meu chefe na empresa. Não pretendo ter problemas na minha vida. Você não pensa que se me forçar a fazer sexo vai ter problemas depois?

-Eu faço tudo o que você quiser, eu lhe dou o cargo que você quiser na empresa. Um carro? Você quer um carro? Diz-me qual o seu preço, eu pago.

-Eu não tenho preço, eu não sou uma mercadoria. Será que você não entende? Vamos embora, por favor?

Ele sai da banheira, se enrola em uma toalha e vai para a cama.

-Vem aqui comigo, não vou fazer mal a você. Vem?

-Não. Desista e me leva embora daqui.

Ele levanta-se da cama enfurecido. Me pega pelos punhos e me leva para a cama.

Arranca minha roupa, eu tento contê-lo, mas ele é muito forte. Ele vira meu corpo. Fico com as costas para cima. Com a gravata ele amarra minhas mãos na cabeceira da cama e com as minhas meias amarra minhas pernas aos pés da cama.

Fiquei totalmente vulnerável.

O vinho e o champanhe faziam tudo circular ao meu redor.
Tentei pensar em algo bom, talvez o mar.
Sim, o mar azul, a areia fina.
Meus pés descalços.
O cheiro do mar.
O corpo inteiro sentindo a onda bater nos meus quadris.
O vento soprando no meu rosto e o sol dourando minha pele.

Mas aquele corpo pesando sobre o meu, aquele perfume forte e ruim, o suor dele pingando nas minhas costas o sexo dele ferindo minhas entranhas, meu corpo desobediente gozando enquanto eu era violada física e psicologicamente.

Todo o trajeto até em casa, nenhuma palavra.

Ele venceu. O mais forte venceu.


Será que é possível recomeçar sem carregar o estigma do passado?
Será que é possível confiar em alguém depois do que aconteceu?
Eu provoquei tudo isso?

Não sei.

Talvez esteja na hora de voltar a viver como Velvet


Vênus

23 de jun. de 2010

Rubras pétalas




















De quantos toques
é feita a tua,
quantos botões
para vê-la crua
com quantos dígitos
arrepia-se
e sua pele,
pele, pele, pele,
superfície
onde se tatua
dentro e fora
a transparência nua


M Diniz

17 de jun. de 2010

Beijo do Vento


















Nos meus lábios
rubros
do teu desejo
nascem pétalas
que o vento
vem e beija
deixando marcas
de sal na pele
a embriaguez
do toque
incendiando
meu desejo

Vênus

6 de jun. de 2010













A razão porque mando um sorriso
E não corro
É que andei levando a vida
Quase morto
Quero fechar a ferida
Quero estancar o sangue
E sepultar bem longe
O que restou da camisa
Colorida que cobria minha dor
Meu amor eu não esqueço
Não se esqueça por favor
Que eu voltarei depressa
Tão logo a noite acabe
Tão logo esse tempo passe
Para beijar você


Paulinho da Viola