25 de set. de 2012

COISAS TUAS














Levo coisas tuas
...
para poder estar contigo
na distância.
Para nunca te perder a companhia,
mesmo não estando.
Levo gravado o teu gesto,
o pranto, o riso, e,
(ora inocente, ora picante),
o teu sorriso,
que é a tua expressão,
o teu maior encanto.
E levo um objecto,
teu pertence,
como se o espaço tivesse autoridade
e o tempo nos afastasse.

Como se fosse preciso...

MARGARIDA FARO, in 44 POEMAS (Fonte da Palavra, 2011)

24 de set. de 2012









"Longe, 
Seu coração bate por mim;
E a sua mão desenha aquele afago
Que me sossega inteiro...
Longe,
...
A verdade serena do seu rosto
É que faz este dia verdadeiro......"

-MIGUEL TORGA, in DIÁRIO I (1941)Coimbra, 7ª ed., 1989)

22 de set. de 2012

CORAÇOM AO VENTO...



















"Fértil agromada no coraçom do vento,
frutas aguardadas no meio das florestas,

eu em ti!,namorando levemente lava rosa,
no côncavo do meu meu corpo desangrado.
Seduce-me agora que a noite chega,
ispe-me num manto de jazmíns e lirios,
como sangue que nos beiços se eternice,
como as asas que nos namoram livremente.
Nos côncavos dos corpos desangrados,
ti e eu adormecemos no nosso fogo queimado
como cervos orgánicos,voraces,decepados,
rasgados,enlouquecidos,entreabertos; devorados
nas aranheiras volateis do nosso amor de sangue.
Seduce-me agora que chega a noite no fluxo
das fontelas que se espandem quentes,mestura
dos zumes que se ceivam no orgasmo pleno...

Fértil agromada no coraçom do vento
ti es a froita que esvara nos meus lábios."

* Este poema encontra-se escrito em Galaico-Português

6 de set. de 2012

ROSA DO MUNDO




























Rosa. Rosa do mundo. 
Queimada.
Suja de tanta palavra.

Primeiro orvalho sobre o rosto.
que foi pétala
a pétala lenço de soluços.

Obscena rosa. Repartida
Amada.
Boca ferida, sopro de ninguém.

Quase nada. 

EUGÉNIO DE ANDRADE, in CHUVA SOBRE O ROSTO, 
(Modo de Ler/Ed. Afrontamento, 2009)

TAMBÉM ESTE CREPÚSCULO...


















Também este crepúsculo nós perdemos.
Ninguém nos viu hoje à tarde de mãos dadas
enquanto a noite azul caía sobre o mundo.

Olhei da minha janela
a festa do poente nas encostas ao longe.

Às vezes como uma moeda
acendia-se um pedaço de sol nas minhas mãos.

Eu recordava-te com a alma apertada
por essa tristeza que tu me conheces.

Onde estavas então?
Entre que gente?
Dizendo que palavras?
Porque vem até mim todo o amor de repente
quando me sinto triste, e te sinto tão longe?

1 de set. de 2012

A EXALTAÇÃO DA PELE
































Hoje quero com a violência da dádiva interdita.
...
Sem lírios e sem lagos
e sem o gesto vago
desprendido da mão que um sonho agita.
Existe a seiva. Existe o instinto. E existo eu
suspensa de mundos cintilantes pelas veias
metade fêmea metade mar como as sereias...

NATÁLIA CORREIA, in POEMAS (1955), 
in POESIA COMPLETA - O SOL NAS NOITES E O LUAR NOS DIAS 
(Dom Quixote, 2007)