7 de jun. de 2011

O Veneno da Serpente










 
A serpente negra rasga ao meio a planície verde em sinuosas curvas e retas infinitas aguçando a curiosidade de saber o que virá pela frente.

Casinhas simples quase invisíveis longe da rodovia, imagino como seria viver assim, longe do mundo, longe da vida que segue louca de passos apressados, de relógios atrozes e informações do que acontece no mundo. Um povoado logo aparece, essa mistura me fascina.

O sol suave do amanhecer, o carro deslizando pelo asfalto e a presença misteriosa dele.
Pouco fala.
Sorri meio nervoso ás vezes e parece distante como eu.

-Viajarei sozinho de qualquer forma. Você não conhece o país, será uma viagem agradável e logo estaremos de volta. Eu sei o que você está pensando, mas não se preocupe. Respeitarei você, só farei aquilo que você também quiser fazer.

-Frase fatal!

No hotel ele já havia reservado um quarto. Para casal.
Eu nada disse, fiz de conta que não notei a intenção dele. No quarto tomei um longo banho quente. Vesti algo confortável e sexy e naturalmente transamos como se fossemos amantes, namorados ou ficantes.

Cruzamos a fronteira e a diferença incrível que encontrei depois de atravessar “a ponte” me deixou perplexa. Um misto de espanto e medo. Muita terra vermelha, uma aparente sujeira e desorganização, pessoas estranhas, com olhares desconfiados e suspeitos.
Por um momento senti que não deveria estar ali. Fiquei sozinha num restaurante enquanto ele foi comprar algo numa loja ao lado.

Um homem com a pele queimada de sol, meio índio, meio chinês veio falar comigo.

-Hablas espanhol?
-Não
-Su amigo me pidió que lo lleve a él.

-Mas, onde ele está? Quem é você?
-Yo soy su amigo. Él tiene un problema y me pidió que cuidar y usted. Ven conmigo por favor.

Eu fui com ele, insegura e desconfiada. Um país estranho, um homem estranho.
Entramos no carro dele quando percebi que atravessamos novamente “a ponte”. Logo depois ele parou o carro num local movimentado. Sem dizer nada parou o carro, me mandou descer.

-Gracias a Dios para ser salvos. ¡Aléjate de aquí. No hablar con nadie. Su amigo no va a volver.

Olhei para os lados desesperada. Já estava fora daquele país estranho, mas muito longe de casa, sem dinheiro, sem minha mala, sem nada e com medo.
Muito medo!

Passei  horas parada, sentada num banco na beira da estrada.
Não sentía fome…pensava apenas em como voltar para casa.

Desamparo!

Não sei quanto tempo se passou, imagino que muito.
Um carro preto parou ao meu lado, dois homens se aproximaram, sem falar nada me seguraram um de cada lado e me levaram para dentro do carro que saiu em alta velocidade.

Pânico!
Não se falavam. Não reagi. Não sabia como agir.

Esperava pelo pior sem tentar me salvar não sei de quem.

O carro para em frente a um prédio cinza, austero e frio.
Poucos carros estacionados, pouca luz.

Numa sala pequena, escura e fría aguardo que algo aconteça. Vejo por uma fresta da porta que revistam uma mala, reconheço minhas roupas.
-Como podem estar com a minha mala? Quem são eles? Onde está Pedro?

Horas lentas e torturantes, frio, fome, sono…e mais medo.
-Su amigo es arrestado. Tráfico internacional de drogas. Tú vienes conmigo. Pidió que cuidar de ti
-Tráfico de drogas? Mas onde ele está? Quero falar com ele. Preciso da minha mala, preciso de dinheiro para voltar para casa.
-No puedo hablar ahora, todavía con el sheriff. Ven conmigo.

Os dois homens seguiram sem se falar,  se olhavam e sorriam cumplices.
Um sorriso asustador. 

O lugar era distante da cidade, uma pequena chácara no meio do nada.

 -Um lugar para descansar antes de voltar para casa, finalmente.

 A casa simples, vários quartos e um bar repleto de bebidas de todos os tipos.
Acenderam a lareira, me refugiei ali junto ao fogo.

Os dois homens logo saíram e me deixaram sozinha. Ouvi o carro se afastando e finalmente tive a sensação de que poderia descansar, estava exausta.
Me despi. A água quente da banheira massageando meu corpo e a dor indo embora, não pensei em nada..apenas relaxar um pouco, esquecer um pouco.

Levantei assustada e ainda nua. Um barulho na porta me fez despertar.

-Quatro homens entraram no quarto, bêbados, usando fardas, armados e com um olhar faminto, terrível, sorriam e se aproximavam mais e mais. Não entendia o que falavam, mas o pavor tomou conta de mim quando entendi o óbvio.
Não tentei fugir.



Abri os olhos e a primeira coisa que vi foram dois olhos cinzas e tristes.
As mãos que cuidavam dos ferimentos do meu rosto eram  enrugadas e escuras, mas suaves.

Uma dor lancinante tomou conta de mim, todo meu corpo era sangue e dor, manchas rochas e marcas de mordidas e arranhões.
-No se mueva, él tomará cuidado de usted niña.
-Quem é você? Quem fez isso comigo? Não entendo. Me ajuda, preciso voltar para casa.
-Tienes que salir de aquí. Si seguimos así van a "matar "a usted. Su amigo le dio a estos hombres a cambio de su libertad. Por favor, niña. Me ocupo de esta casa, no eres el primera en sufrir así. ¡Aléjate de aquí. Escape!

Desespero. Dor.

A manhã ainda está longe de chegar,  muito frio e ruas desertas. Apenas um vulto com uma capa de capuz negro anda sem rumo pelas ruas iluminadas por luzes cambaliantes e fantasmagóricas.
A bruma cobre tudo com seu manto gélido e silencioso.

 “A ponte”.

 Avisto a ponte muito próxima.
Não sei de qual lado da ponte estou.

No me país ou no país estranho. A ponte desliza como a serpente negra do asfalto, longa e infinita na  noite escura.
Com passos firmes caminho em sua direção.

Decidida a viver na ponte.
Debaixo da ponte
Sob a ponte
Sob a água...






Continua......................................

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